4 de outubro de 2011 Andreia Calçada

Brigas no começo do relacionamento tendem a continuar ao longo dos anos


Publicação:
 27/09/2011 08:29 Atualização: 27/09/2011 14:30
 (Bruno Peres/CB/D.A Press. )

Namorada arrumada e simpática, namorado educado e cheiroso. É assim que muitos relacionamentos começam. Depois do casamento, porém, as coisas podem mudar um pouco de figura. Aparecem as manias, o desleixo cotidiano e a toalha molhada em cima da cama. Se é impossível saber como o amado se comportará depois do “sim”, um detalhe parece ser possível de prever: a frequência com que os pombinhos brigarão. De que forma? Basta olhar para o presente, ensina a pesquisadora Claire Kamp Dush, do Departamento de Desenvolvimento Humano e Ciência da Família da Universidade de Ohio, nos Estados Unidos. Segundo ela, casal que se desentende muito no começo da relação continuará em pé de guerra anos depois. E os que brigam pouco seguirão em paz.


A psicóloga defende esse ponto de vista com base em uma pesquisa que liderou ao longo de 20 anos, publicada recentemente no Journal of Family Issues. O estudo acompanhou cerca de mil casais formados por pessoas com mais de 20 anos de 1980 a 2000. Ao longo de todo esse tempo, os conflitos conjugais entre os voluntários foram medidos pela frequência com que os entrevistados disseram discordar do cônjuge: nunca, raramente, às vezes, frequentemente ou muito frequentemente.


Com base nesses resultados, os pesquisadores separaram os casamentos dos participantes em categorias de alto, médio e baixo nível de conflito e avaliaram se essas frequências variavam como o passar dos anos. “Não houve muita mudança no conflito ao longo do tempo”, conta Claire ao Correio. “Houve uma diminuição muito ligeira, no valor de desentendimentos relatados nos anos finais do estudo, que foi um pouco maior para os casais de alto conflito. Ainda assim, as diferenças ao longo do tempo foram pequenas”, completa. Os resultados podem ser uma boa notícia para os casais que raramente se desentendem, mas, para quem vive entre tapas e beijos, pode ser sinal de que é preciso mudar de comportamento enquanto há tempo.


Para a administradora Virgínia Félix, 24 anos, e o marido, o estudante Bruno Félix, 25, as brigas fazem parte do relacionamento, mas não devem ocorrer com muita frequência. Juntos há oito anos, os dois buscam o diálogo para manter um nível baixo de conflitos. Para o casal, a maior dificuldade surgiu na mudança do status da relação de namoro para casamento. “Cada um tem manias e hábitos que às vezes vão de encontro com os do outro. Quando a gente namora, a gente acaba vendo só o lado bom”, afirma a administradora. Para evitar desentendimentos, Bruno aposta em solucionar qualquer rusga na mesma hora. “No início, ela não gostava muito de conversar quando acontecia alguma coisa. Mas, para mim, é fundamental, porque evita que voltemos a brigar sempre pelos mesmos motivos e que a relação fique desgastada.”


De acordo com a psicóloga especialista em terapia de casais Aline Coelho, brigas constantes não acontecem sempre pelos mesmos motivos, mas costumam ter uma raiz comum: a falta de compreensão mútua. “Às vezes, eles têm pontos de vista diferentes que não são respeitados pelo outro. Suas opiniões, formas de se relacionar e pensamentos não serão iguais sempre.” Para ela, expectativas também podem ter grande influência nas brigas conjugais, seja por qual motivo for. Se o marido ou a esposa não se comporta como o cônjuge espera ou gostaria, a frustração pode causar um desentendimento.

 (Ed Alves/Esp. CB/D.A Press)

Parceria
Os pesquisadores de Ohio usaram também dados de outra pesquisa, conduzida na Penn State University e na qual foram entrevistadas, por telefone, 2.033 pessoas casadas com média de idade de 55 anos. Muitas delas foram ouvidas cinco ou seis vezes entre 1980 e 2000 sobre a qualidade do casamento e a relação com os cônjuges. Ao analisar essas respostas, Claire e sua equipe descobriram que os casais que costumam tomar decisões juntos apresentam um índice menos de conflito. “Isso me interessou muito, porque pensávamos inicialmente que esse fator poderia criar mais oportunidades de conflito. Porém, se ambos têm palavra na tomada de decisões, eles estão mais satisfeitos com suas relações e têm menos motivos para discutir”, analisa a americana.


A estratégia funciona bem para a farmacêutica Thatiane Chagas, 23 anos, e o editor de vídeo Fábio Maia, 26. “Claro que existem opiniões diferentes, mas se cada um cede um pouquinho,  não é preciso brigar por besteira”, diz Thatiane. Adaptação é a palavra de ordem para o casal, que tem horários, hábitos e rotinas diferentes, aos quais precisam se adequar. Para Fábio, a convivência pode fazer bem ou mal para o relacionamento. O segredo é saber tirar o melhor dela. “Desentendimento de vez em quando é normal, mas é preciso entender que não se está mais sozinho. Se a gente escolhe a pessoa para fazer parte da vida da gente, tem que administrá-la em conjunto.”


Outro fator que parece ajudar os casais a brigarem menos, segundo a pesquisa da Universidade de Ohio, é a crença de que o casamento é para a vida inteira. “As pessoas que acreditam que o casamento deve durar para sempre provavelmente estão mais propensas a deixar as divergências de lado”, analisa Claire. Para o advogado Márcio Prado, 32 anos, casamento é para a vida toda e, por isso, é preciso conhecer bem o outro antes da decidir juntar as escovas de dente. Quando ele e a mulher, Luciene, 30, decidiram trocar alianças, estavam juntos havia cinco anos. “No começo foi difícil, porque não nos conhecíamos direito e tínhamos muitas diferenças. Eu sou católico e ela, evangélica batista, então tivemos que valorizar os pontos em comum para superar os divergentes.”


 (Dênio Simões/Esp. CB/D.A Press)
Amadurecimento
Discordando um pouco da pesquisa norte-americana, Luciene acredita que o amadurecimento pode ajudar um casal a ter menos desentendimentos. “Todo mundo tem medo do diferente, então no início a gente brigava todo dia, era muito conturbado. Hoje, melhorou tanto que não me lembro da última vez que discutimos”, conta.


A psicóloga Andréia Calçada defende que a tendência varia de casal para casal e nem sempre é possível identificar um padrão. “Casais com dificuldade no relacionamento tendem a repetir um ciclo vicioso de desentendimentos que pode minar o casamento.” Para Andréia, viver entre tapas e beijos só é bonito na música. “Eles podem até conviver nesse clima por algum tempo, sustentados pela paixão, mas a longo prazo isso pode destruir a relação.”


A especialista alerta, no entanto, que não discutir nunca costuma ser um mau sinal. “Não existe casal perfeito, que concorde em tudo. Se não há conflito, ou há desinteresse na relação ou tem alguém sempre cedendo e se submetendo às vontades do outro. Tem de haver um meio-termo para se viver um casamento feliz e duradouro”, opina.


As pessoas que acreditam que o casamento deve durar para sempre provavelmente estão mais propensas a deixar as divergências de lado”
Claire Kamp Dush, pesquisadora da Universidade de Ohio

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